terça-feira, janeiro 15, 2008

Mudam-se os tempos, não se mudam as vontades? (!...?)

Presto mais um tributo a meu mui citado mestre JA Maltez, agora pelo seu post de hoje, onde, de entre muitas referências possíveis de alinhar para corroborar esta sua manifesta revisitação matinal, relativamente à confusão conceptual gerada nalgumas cabecinhas de abóbora com coroa de beldades intelectuais, atrever-me-ia a citar António Ventura, na já aqui referida obra dirigida por Pedro Calafate (1):

“(…) Houve sempre no movimento operário e socialista português – e não só – uma grande dificuldade em lidar com conceitos precisos, em virtude do deficiente acesso aos textos fundadores, às fontes e aos comentários. (…) De tudo isto resulta uma deficientíssima formação ideológica, com frequentes equívocos e afirmações de que se perfilhava uma postura que entrava, em boa verdade, na mais completa contradição com posições tomadas e textos produzidos. (…) O escritor libertário Emílio Costa – um profundo conhecedor do movimento operário e social da época – escrevia em 1903: «O socialismo não tem progredido entre nós, porque não se coaduna com o carácter do povo e porque tem praticado erros de propaganda […]. O português é essencialmente federalista, autónomo e regionalista. Suporta actualmente uma feroz centralização, porque está bestializado, sem consciência do que foi e é capaz de ser. Por isso lhe há-de repugnar fatalmente a doutrina do socialismo de Estado; ao passo que há-de aceitar de boa vontade a doutrina libertária, que é federalista por excelência … Em cada cem portugueses, dez compreendem melhor o Capital do que A Conquista do Pão; noventa preferem o livro de Kropotkine ao de Marx».

(…) se quisermos encontrar, nessa época, algumas abordagens mais aprofundadas dos princípios marxistas, devemos procurá-las fora do âmbito socialista e operário.”

Por mim, continuo a revisitar alguns dos trechos musicais que espelhem as angústias dos tempos que passam, e elevem a alma aos cumes da satisfação sensorial, já que a razão não medra em tão lastimável cidade … tão longe de Deus e dos homens de boa vontade! Cada vez que nos afastamos, faleço um pouco, diz este já clássico trecho americano, para me fazer lembrar a distância a que aquela polis, minha amada, me deixa a alma fria, descontente, inconsolada!




(1) CALAFATE, Pedro (coord.), História do Pensamento Filosófico Português, vol. V, O Século XX, Tomo 2, Círculo de Leitores, Lisboa, 2002, pp. 195 e ss.