terça-feira, julho 18, 2006

Opinião ... de Outros Sítios

Mais uma composição musical deste Jornal de Negócios, de mais este autor a juntar à nossa lista branca!
Certamente que o vulgo cidadão, como qualquer um de nós em princípio o é, não tem de fazer ideia, nem lhe serão, talvez, dadas as condições que lhe permitam fazê-la, acerca do que, realmente, tratam os líderes das principais potências mundiais. Isso seria bom demais. O que nenhum homem ou mulher, que se julgue cidadão de qualquer sociedade, deve permitir a quem os governe, seja dentro da sua jurisdição nacional, seja no concerto das respectivas competências transnacionais, é que os actos de governo sejam de uma incompetência e irresponsabilidade que ultrapassam os limites da tolerância política e ofendem as próprias instituições que os designaram. Seja em que domínio orgânico for: na permanência dos 5, na segurança dos 15, na grandeza dos 8, etc., etc.!

Sérgio Figueiredo
"Ópera em S. Petersburgo
São Petersburgo está a comemorar o ano do centenário de Dmitri Shostakovich, que ali nasceu ainda no czarismo e consagrou-se um dos clássicos mais famosos do século XX.
Não foi, seguramente, a cimeira do G8 um acontecimento à altura das sinfonias, operas e outras obras do compositor russo. Ou soviético, porque foi, durante quase toda a sua vida, um ícone da revolução bolchevique.
A cimeira do G8 foi aliás um clássico, mas sem música. Um encontro de menores denominadores comuns. Uma simulação de entendimentos que não existem. Um encontro de parceiros que não emparceiram. Um ritual que acaba sempre numa declaração final. Que não declara nada. E que podia ser final, se nos fizesse o favor de ser a última.
Enfim, a Rússia recebeu ontem os EUA, o Japão, o Canadá e mais Barroso a liderar uma comitiva de quatro líderes europeus, para escrever algo que Shostakovich nunca fez: uma ópera bufa.
Não é que faltem problemas para resolver. Não é que grande parte desses problemas lhes passe à margem. Não é que estejam eles isentos de responsabilidades nos assuntos em agenda.
Nada disso, há problemas graves, parte desses problemas está a por em causa o modo de vida das sociedades que supostamente representam. E, o que é pior, são eles, presidentes e primeiro-ministros das nações mais ricas, o motivo que leva ao adiamento das soluções.
Vejamos a agenda inicialmente prevista para a Cimeira de S. Petersburgo: energia e comércio. Não é coisa pouca. E muito menos matéria para ficar apenas no plano da retórica.
Pois bem, pressionados pelos acontecimentos do Líbano (ou, mais concretamente, pelos media internacionais, que estão naturalmente concentrados naquele cenário de pré-guerra), três presidentes e cinco primeiro-ministros tomaram duas decisões: produzir uma lenga-lenga sem conteúdo em matéria de segurança de abastecimentos energéticos; reduzir as negociações sobre liberalização do comércio mundial a coisa alguma.
Exceptuando a Rússia, nenhum dos países do G8 pode dormir em tranquilidade perante a radical transformação que está a ocorrer no plano energético à escala global. E todos os outros países, sobretudo os europeus, têm pesadelos com as reais intenções de Moscovo em matéria energética.
Aliás, não foi Chirac ou até Berlusconi que, há poucos meses, foi ao «antigo império», numa capital do Báltico, avisar Putin que não podia continuar a utilizar os seus recursos de energia para «fazer chantagem» com o resto da Europa. Foi Cheney, o homem que os americanos insistem eleger para a vice-Presidência.
A declaração final sobre segurança energética prefere evidenciar uma divergência sobre o nuclear. Assunto para jornalista ver. Porque é assunto menor. O único que eles pensam que nos deixam ver. É certo que não escondem o acesso aos mercados. E que, em uníssono, voltam a declarar o «apoio aos princípios da Carta de Energia».
A renovação de uma hipocrisia chamada de Tratado há doze anos e que a Rússia, a anfitriã, nunca ratificou nem pensa vir a ratificar. Mas ninguém ousa sequer lembrar a crise Rússia-Ucrânia, em que dois dias bastaram (dois dias!...) para metade da UE sofrer, em pleno Inverno, rupturas de abastecimento de gás.
Sobre comércio internacional, sobre a OMC, sai um ultimato para os negociadores negociarem. Um auto-ultimato. Shostakovich, que foi Primeiro Secretário da União dos Compositores Soviéticos e recebeu o Prémio Lenine, a medalha do herói trabalhador socialista, deveria estar vivo para compor uma sinfonia para este regime. Pelo menos, a música ouvia-se..."