terça-feira, agosto 29, 2006

Opinião ... de Outros Sítios

Em memória do Professor Doutor José Maria Gaspar ...
Que, na cadeira de Direito Administrativo, nos ensinou que, nesta terceira República, vivemos uma autêntica "diarreia legislativa". E não é que ele lá tinha as suas razões, teóricas e retóricas, quantas bastasse para, mesmo à margem de uma definição científica da provérbica expressão, se constatar que o caminho que os procesos legislativos têm seguido (latamente entendidos com todos os factores que os contornam em consideração) só comprova aquela que quase pode ser uma máxima para os políticos actuais: "o que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira"!!! em mais esta do Jornal de Negócios.
"Cair na real
Luísa Bessa
O que nasce torto tarde ou nunca se endireita. Diz o ditado popular e deve ser verdade. O dito aplica-se neste caso ao Código do Trabalho.
Nascido do ímpeto reformista do Governo de Durão Barroso, que como se sabe não resistiu a dois anos de crise económica, o Código foi apresentado para revolucionar das leis do trabalho em Portugal, contribuindo para uma maior flexibilidade e por essa via para o aumento da competitividade da economia.
Os objectivos eram justos mas depois de mais de um ano de discussão, o resultado final ficou aquém das expectativas. Foi a consequência da via sacra da política em Portugal: contestação sindical incluindo uma greve geral, e já depois de aprovado, da passagem pela fiscalização preventiva do Tribunal Constitucional, que declarou inconstitucionais alguns artigos.
Expurgado de inconstitucionalidades, o Código entrou em vigor em Dezembro de 2003. Desde então, ao contrário do que vaticinavam as centrais sindicais, nenhuma revolução varreu as relações laborais em Portugal. Tudo como dantes, neste país de brandos costumes. E ainda haveremos de ver os que o atacaram a defendê-lo, em nome dos direitos adquiridos...
A relação do PS com o Código também é ambivalente. Em 2003, como maior partido da Oposição, votou contra. Na campanha para as legislativas de 2005 fez da revisão antecipada uma das suas principais bandeiras, que verteu na íntegra no programa do Governo.
O Governo, que pretendia equilibrar a relação de forças entre trabalho e capital, protegendo os trabalhadores, comprometia-se a seguir «uma estratégia de transformação modernizadora da legislação laboral» - o que quer que isso quisesse dizer. Mas, embora em sentido contrário à mudança iniciada por Durão Barroso, também o ímpeto de Sócrates esmoreceu.
Vieira da Silva agiu primeiro como bombeiro. Com a lei 9/2006 introduziu alterações de carácter urgente para impedir que à caducidade das convenções colectivas se seguisse o «vazio», respondendo à pressão dos sindicatos que se viram pela primeira vez confrontados com o risco de as convenções caducarem em situações de falta de acordo entre os parceiros (antes do Código na falta de acordo entre patrões e sindicatos as convenções antigas mantinham-se em vigor, o que significava na prática a manutenção do status quo). A lei entrou em vigor no início do ano mas nem por isso o ritmo de assinatura de novos contratos acelerou de forma significativa - até meio do ano havia menos de cem novos contratos assinados, em média com os 200 do ano anterior. Com a nota positiva de alguns bastante inovadores, como o do sector do vestuário.
Apagado o fogo das convenções, o Governo reduziu a ênfase na revisão do Código, uma postura que limita os atritos com as confederações patronais, em especial com a CIP, que logo quando o Governo tomou posse havia declarado inaceitável a revisão antecipada.
E assim a comissão do Livro Branco, que desde há meses se sabe que será presidida por António Monteiro Fernandes, continua a marcar passo, sem ser formalmente constituída. Sem dar o braço a torcer, o Governo acabou por atirar a revisão para 2007, a data prevista no próprio Código. Mas pelo caminho que as coisas estão a tomar, até pode ser depois.
Tudo depende da amplitude da revisão, que os sindicatos, em especial a CGTP, vão querer maximizar. Veremos como descalça o Governo a bota de atirar a conflitualidade entre patrões e sindicatos inerente ao processo de revisão para o segundo ciclo da legislatura. Vieira da Silva, às voltas com a reforma da Segurança Social, pode estar renitente em comprar outra guerra sobre o Código do Trabalho. Ou pode, simplesmente, ter caído na real."