quinta-feira, março 27, 2008

A César o que é de César, ao Povo o que é do Povo!

E não metam Deus ao barulho...!
Há já algum tempo que observo este articulista do aqui muito citado JNegócios (já lhe chamei escola prática de sociologia). Mas neste artigo dou-lhe nota superior, pela pertinência (conteúdo e oportunidade) que aí revela.

E, além das razões evocadas para os excesos desta norma 'anormal', justificadora de um Portugal cheio de 'Robins dos Bosques e das Cidades', ainda nos resta averiguar da bondade da mesma na perspectiva catolaica, onde certamente se dirá: "A Deus o que é de Deus, a César o que é de César". Mesmo com pretextos de um novo e eventual cisma portucalense, onde se arvora a virtual lusa protestandade(?...). E que não venha o PS clamar pela laicidade do Estado, agora arrastado por esta onda pseudo-socialista e para-ateísta q.b., se os canais comunicacionais da Igreja condenarem a dita, queixando-se à AdC - vistas bem as coisas (coisas de observação microssociológica 'à lupa'), se se adoptar por uma posição moral comum ainda se esvaziam as fontes de receita de tão virtuosa Instituição, que trabalha para tão digníssimos fins ...(?!) ...

Bom, vejamos o que nos diz, sobre esta nubentíssima mas (parece) enublada norma, o já referido

João Cândido da Silva







"O nó do Fisco

Exigir aos recém-casados que dediquem uma parte do seu tempo e paciência à denúncia de eventuais irregularidades fiscais, parece uma medida um tanto ou quanto antipática e disparatada. Sobretudo quando o papel de inspector a que o casal é forçado, sob a ameaça de vir a ter de pagar coimas pesadas, visa expor os fornecedores de serviços que ajudaram a assinalar a celebração do nó.

Ainda assim, entre o objectivo de combater a fuga aos impostos e os meios que o Estado se mostra disposto a utilizar, nem tudo é motivo para revolta e indignação.

Algumas estimativas, provavelmente conservadoras, referem que a economia paralela representará, em Portugal, um quinto do valor total da produção anual de bens e serviços. Está em causa dinheiro suficiente para, num passe de magia, fazer desaparecer os problemas nas finanças públicas, se a carga fiscal que pesa sobre a economia oficial incidisse, na mesma proporção, sobre os fluxos que, ano após ano, vão escapando aos circuitos formais.

Pensar que seria possível reduzir aquele fenómeno a zero, é apenas um belo sonho na mente do mais criativo ministro das Finanças. Num país de baixos rendimentos e carga fiscal elevada, a pressão para o mais honesto dos cidadãos se tornar cúmplice da informalidade é enorme.

Encontra-se na diferença de preços a que lhe são propostos os numerosos serviços de que necessita. Terá de os adquirir mais caros se exigir recibo, já que o fornecedor tratará de incluir não apenas o IVA, mas também a soma relativa a outros encargos que terá de liquidar, como o imposto sobre o rendimento. Tudo isto, naturalmente, sem abdicar da margem de lucro. Como decisor racional que é, o consumidor faz as suas contas e opta por aquilo que melhor se adequa aos seus interesses. Acaba por comprar o mesmo, por um preço menor, ainda que à custa de uma perda para os cofres públicos.

Ao decidir colocar pressão sobre os recém-casados para que mostrem toda a documentação relativa à aquisição de bens e serviços relacionados com o matrimónio, a administração fiscal revela querer dar luta à informalidade nesta área de negócios. Se um dos mais poderosos incentivos para cumprir as obrigações fiscais está na necessidade de haver uma percepção generalizada de que quem a elas se furta sofre consequências, então o Fisco decidiu transmitir sinais de que pretende apertar o cerco e acabar com a impunidade. Da máquina que cobra os impostos é isto que se espera. O problema está nos excessos.

Nas cartas enviadas aos contribuintes recém-casados pede-se, expressamente, a denúncia de situações para as quais aqueles não são tidos nem achados. E lança-se, de forma coerciva, o ónus do combate a eventuais situações irregulares exclusivamente sobre uma das partes envolvidas nas transacções efectuadas. A ânsia de cobrar mais receitas de impostos não justifica que se utilizem quaisquer meios. A capacidade dos contribuintes cumpridores para compreenderem e aceitarem a actuação da administração fiscal tem limites, quando não vislumbram os benefícios que o sucesso no combate à fuga fiscal deveria proporcionar-lhes."